segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Acendeu o último cigarro. É o processo, o ritual de despedida.
A despedida carrega o medo e a insegurança, a síndrome de peter pan e a ojeriza ao amadurecimento; ela se despede de um estilo de vida.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Blow out all the candles!

  Os olhos lacrimejaram depois de olhar fixamente para os traços brancos pintados no asfalto que passavam rapidamente; era o chão ou o céu - não fazia mais sentido olhar o inalcançável. Já não sabia se eram lágrimas de vista cansada ou de alma pesada, mas que diferença faria?
  A vida inteira acreditei que o inalcançável fosse apenas uma expressão para desiludir quem pensasse diferente... Temo que eu tenha, por fim, aceitado me encaixar. Assim como me encaixei em uma poltrona que lesava minhas pernas ao ponto que a dor física se equilibrou com a emocional.
  Foram algumas horas de viagem. A playlist já estava na terceira repetição e eu estava com aquele sentimento de que se a minha música preferida fosse a próxima a tocar tudo estaria bem... Mas eu havia me esquecido de adicioná-la a nova playlist e ela não tocou. Assim como a razão não tocava mais na minha mente. Eis, de volta, o desequilíbrio; amargo como jamais tinha sido antes.
  "Collecting names of the lovers that went wrong" - minha imaginação tornava real a sensação auditiva; eu podia ouvi-la como se realmente estivesse tocando. Quantos amores mais teriam que dar errado até que eu entendesse que o problema estava em mim?
  Sempre esperei demais das pessoas e ninguém conseguiria preencher o vazio dos meus pulmões para que eu desse um suspiro sincero. A nicotina sempre se encarregou disso. 
  Eu me acostumei a idéia de que tudo passa. Até o mais puro e belo romance passa se tornando uma piada interna na rodinha sentada no fundo do bar; eu gargalho e encho o copo para me levantar e ir ao fumódromo - não dá pra sonhar acordada com pessoas ao redor.
  Uma nova cidade, um novo bar, uma nova marca de cigarro e uma cerveja artesanal com gosto de café requentado; tudo parece novo demais para uma consciência tão velha. Parece que todos os dias eu pego um comprimido de desilusão e o engulo como se fosse meu fiel escudeiro. Ninguém pode te magoar quando você já não tem ilusões, da mesma forma que ninguém pode te surpreender se você não tiver esperanças.
  A cigana que passava pela rua pegou a minha mão como se tivesse a solução dos meus problemas e enquanto olhava aterrorizada nos meus olhos, disse: "Uma face tão nova para uma alma tão antiga. Você é muito apegada a destruição." e me aconselhou que acendesse uma vela para o meu anjo da guarda me proteger.
  Tem uma vela acesa em cima do armário da cozinha com uma carta embaixo escrita para o meu anjo da guarda: "Me poupe de mim mesma, por favor. Assim seja.".
  Triste perceber que não existe ninguém no mundo que possa me ferir mais que eu mesma e disso eu tenho corrido com todo o meu fôlego. O problema é que depois do vício, fôlego não é alternativa e correr sempre foi um caminho muito difícil para alguém tão apaixonada pela instabilidade caótica que a minha vida pode criar da noite para o dia. Eu estou fadada a lidar comigo até o fim dos meus dias.
  Há quatro anos que penso em reescrever um esboço de livro que perdi, mas o medo de me reconectar a tudo o que me fez ser como sou me petrifica. A busca pelo auto conhecimento é uma maldita faca de dois gumes quando você se ilude que perdoou o mundo mas suas unhas pagam por essa frustração toda vez que solta uma lasca nos dentes.
  O verdadeiro problema está em aceitar que possa ser verdade quando ele diz que me ama, mas que me ama com todos as minhas qualidades e mais ainda pelos meus defeitos...
  A definição de flagelação é esperar ansiosamente pelo dia em que ele irá me abandonar numa rua vazia e insuportavelmente fria que se assemelhe ao estado da minha alma após ele me dizer que finalmente reconheceu que seu equívoco; e toda a esperança que eu engoli durante o tempo que ficamos juntos irá descer como um veneno e me causar um refluxo para o resto da vida.
  "PARADA EM SÃO PAULO! FAVOR DESCER DO ÔNIBUS!", mas eu queria mesmo era descer do trem desgovernado que eu chamo de mente já que ele não me pertence. Ele nunca poderia me pertencer já que isso pediria que eu o pertencesse em troca... Não posso entregar algo que sequer me pertence no momento. Eu me perdi no meio das minhas neuroses e dos pensamentos contínuos de que estou fadada a não ser de ninguém, sequer minha. 
  

sábado, 11 de julho de 2015

Seu nome é Karma!

Seu perfume era como um afrodisíaco natural que se deveria comercializar como uma espécie de poção amorosa. Eu nunca havia experimentado uma fragância que tivesse tanto controle sobre mim.
Não era só o cheiro mas a forma como ele mexia os dedos assinalando os instrumentos das músicas... Ah, era como uma varinha de condão que me regia para onde quisesse; esse era o início do meu fim.
E desde então, ele esteve aqui. Principalmente, quando não esteve.
Eu forço a memória e consigo ouvir sua voz e suas oscilações entoando alguma piada sexualizada intencionalmente para depois me dizer que não se trata apenas de sexo mas sim de um "algo mais".
No meu dicionário esse "algo mais" vem seguido de uma imagem onde eu estou encostada em algum canto de parede escuro balançando o meu corpo enquanto abraço minhas pernas agachada e choro dizendo ao mundo "Quanto está o score do Karma, agora?"; mas além disso, é o último suspiro da menininha crente dentro de mim que aguarda ansiosamente por uma demonstração de que isso, de fato, possa ser verdade.


quarta-feira, 17 de junho de 2015

"Ninguém pode, por muito tempo, ter um rosto para si mesmo e outro para a multidão sem no final confundir qual deles é o verdadeiro." - Hawthorne, Nathaniel

sábado, 6 de junho de 2015

A história de Bia.

Bia sempre foi uma criança introvertida que não sabia como impor suas vontades ou necessidades as pessoas a sua volta. Sempre soube que seria como um hamster colocado em um aquário de cobras quando saísse de sua barraca de lençol arquitetada cuidadosamente no centro de seu quarto - o mundo era um lugar além de hostil e seu certificado de "Como se adequar entre os idiotas que você despreza" venceu antes mesmo que ela soubesse que o tinha.
Sentia atração pela vizinha, se apaixonava pelo vizinho mas no final do dia declarava toda a sua devoção por sua mãe - seu instinto de proteção era voltado a ela. Era a aluna com notas altas que engolia alguma palavra prolixa enquanto soluçava chorando depois de algum colega de sala taxá-la como "inteligentizinha" e chutar sua canela.
No entanto, a escola sempre foi o refúgio quando precisava refletir sobre seu lar desestruturado, sua imagem paterna alcoolizada e sua necessidade em proteger a imagem materna do que ela esperava que fosse uma prévia da ruína matrimonial que viria.
Bia perdeu sua imagem paternal alcoolizada para o abandono afetivo de fato. Nunca soube como lidar com todos os seus piores sentimentos e ainda ser o apoio a pessoa que ela mais amava nessa mundo - sua mãe. Bia se perdeu em meio ao caos interno e a urgência em crescer para tomar as rédeas da responsabilidade - aos 13, Bia havia se tornado outrém.
A escola deixou de ser refúgio para se tornar um campo de batalha onde crianças pseudo crescidas e mal amadas com egos feridos estavam prontas para aniquilar qualquer espectro de vida que pairasse ali. Bia deixou de ir à escola para jogar video game na casa de um amigo da padaria. Seu amigo lhe dava kinder ovo e aquele gesto continha mais amor do que ela jamais poderia imaginar receber algum dia.
Bia foi levada a acreditar que a plenitude do amor se encontrava embaixo de suas roupas enquanto seu amigo suspirava no seu ouvido palavras amorosas que ela não sabia sequer o significado já que nunca as tinha ouvido. Não sabia ao certo se era aquilo que queria mas não poderia contrariar a única pessoa que tentou fazê-la se sentir amada; deveria ser aquilo. Aquilo era amor! E com toda a inocência de seu senso crítico mal trabalhado, de seu hímen intacto e de que aquilo era amor; se entregou. A dor que sentia não representava perigo maior do que havia sentido durante toda a sua infância, então, deveria ser mesmo amor.
E a única forma que ela aprendeu a amar foi através do seu silêncio... Que se perpetuou por alguns anos, como se estivesse submersa, impedida de respirar durante todo esse tempo.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

"Privilegiado de tevê"

Lá vem um conto sem cortes ou censuras
Um retrato sem imagens só rasuras
O que eu sinto tem que fazer mudar
Não dá pra continuar assim

Sessenta passos e eu sigo ao calabouço
Escondendo o medo do teu bolso
A opressão não pode me parar
Cai no mundo e tenho pelo que lutar
Lutar por mim, por todas nós!

Recobro à vida pra logo perdê-la
Você se foi mas ainda está na cabeceira
O comprimido feito pra limpar
Na sujeira me forçaram a ficar
A entrar... Entrou em mim!
Me machuca.

Silenciaram o meu assassinato
Lavaram a cueca do culpado
Disseram que eu já poderia prever
Se veste assim, então, quer pagar pra ver!

Então vê! O que você causou a todas nós
Não é você e não dói o quanto deve doer
Não em você... Um privilegiado
Privilégio de tevê!

Por todas que tiveram seus corpos violados
Lamentando aquela saia ter usado
Por todas nós cuja alma foi roubada
Fundo do poço nunca foi pra nossa alçada

Se a opressão acontece todo dia
Não se adapte, contraia alergia
Quero ver patriarcado nos calar
Enquanto vejo o machismo afundar!

Então vê! O que vocês causaram a nós
Não são vocês e não dói o que dói em mim!
Dói em nós, nas minorias. Não em você
Maldito, privilegiado de tevê!

E no final das contas a gente vira estatística
Um cheque mate no jogo dessa política
Política pra defender quem? Eu pergunto
Uma mulher é estuprada a cada 4 minutos
Violência contra mulher virou teste de virilidade
Sem consciência que pese na senilidade
A impunidade dos culpados alimenta a cultura do Silêncio
São crianças violentadas se expressando por desenhos
Imagem de uma nação que culpa a vítima
Imagem de uma vítima que se culpa
O medo e a vergonha escondem essa sujeira
Sujeira de quem? Eis a brincadeira...

A vida chama e devo continuar
Levando amor a quem quiser me escutar
Independente do que você protege
Vamos a luta, um dia a gente consegue

Eu vou mudar essa ideologia
Salvar o nosso dia.


Além de uma música, uma mensagem: "Por mais que pareça que a sua alma foi roubada enquanto o seu corpo foi machucado, por mais que pareça que tem uma bola de ferro presa na sua garganta te impedindo de gritar por socorro, de gritar de ódio, de gritar por vingança ou de gritar por justiça; você não está sozinha! O isolamento, o silêncio, a humilhação, a vergonha, a sujeira que você acredita mesmo que está em você; nada disso, nunca disse respeito a você e não podem te vencer agora. Por mais que o mundo te diga que você é a culpada, por mais que você fique revivendo aquele momento tentando encontrar onde foi que você falhou, por mais que você esconda a sua história por medo de ser taxada como aquela que mereceu por algum motivo que nunca seria o suficiente; por mais que o mundo caia em cima de você, por mais que te abandonem e te julguem; você nunca mereceu nada disso e ninguém nunca poderia merecer algo assim. A vida deve continuar e não permita que te forcem a abaixar a cabeça enquanto o culpado sai ileso. Não permita que esse tipo de situação - o silêncio; aconteça a outras pessoas. A mensagem final é: SORORIDADE! Acima de tudo."

quinta-feira, 21 de maio de 2015

A Era do silêncio.

Uma unha, um cigarro e um olhar. Acabei notando: perdi a minha voz!
Começou a era do silêncio... Não falo da voz potente e grave entoando alguma música que faz os pelos arrepiarem, mas da voz que fala ao meu ouvido que o dia amanhã ainda irá brilhar. A mesma voz que grita por princípios que só ela poderia me levar a acreditar. A característica dessa voz era esperança... Talvez prepotência. Mas ainda esperança. Esperança essa que eu nunca precisei analisar já que sempre esteve ali, presente e constante, mesmo quando me encontrava em meio ao caos emocional; mesmo quando não parecia haver uma luz no final do túnel, essa voz acendia em neon. Talvez não a luz que todos aprovassem, mas a luz que fazia sentido para mim. No final das contas, o meu mundo e o meu túnel são partes integrantes do meu Estado interior sob uma forma de governo egocêntrica e individualista; nada mais justo não caber a mais ninguém.
Mas parecia que alguém tinha arrombado os portões de aço entre as muralhas do meu mundo! Qual foi o gatilho que deu essa brecha? O mesmo gatilho que abastecia a voz: EU.
Eu estava de frente ao que poderia ser o grande amor da minha vida já que eu havia vivido aquela cena na minha cabeça mil vezes antes mesmo de nos conhecermos.
Eu e meu hino clássico que ecoa entre as feridas expostas que eu me recuso a fechar: "e se... e se... e se...". E se, eu retirasse os "e se"s e parasse de buscar razões para lamentar quando vivo tempos de calmaria? Continuo no "e se" e ele conseguiu me silenciar.
"E se, realmente, ele tiver razão?", "E se, tudo o que eu acredito não passar de uma invenção para amenizar o 'se sentir fora da caixa'?", "E se, ele descobrir a minha farsa?", "E se, eu concordar com ele e acreditar que sou uma farsa?" e o famoso: "E se eu for uma farsa?" - não precisávamos trocar uma só palavra.
Farsa? É, aquele sentimento que aparece de forma inesperada, sem circunstância certa e sem pedir permissão: não obstante a certeza de insuficiência, preenche os critérios para se tornar uma farsa. O que define uma farsa? Eu. Para quem eu defino a farsa? Aparentemente, para alguém que eu não conheço.
Ouso caracterizar essa descoberta da farsa como uma lacuna entre a razão e o amor próprio; a ponte entre ambos fora derrubada pelo pé de feijão das trevas plantado, estratégicamente, embaixo. Quem plantou? Eu vou jogar essa culpa nele porque auto sabotagem é um outro estágio de silêncio... Tentei explorar esse silêncio e tudo o que consegui foi ouvir um eco como se estivesse nas montanhas:
"QUE PORRA É ESSA, ANA?! Quando foi estabelecida essa regra de que você se importa com o que alguém possa ou não pensar em relação a você? E qual é a efetiva diferença que isso faz na sua vida ou no seu cotidiano? Pra quê? Não 'por quê?' mas: PRA QUÊ? A opinião alheia sempre diverge com a sua e isso nunca fez diferença em como você administra o seu mundo. A beleza da individualidade está em saber que a sua felicidade, o seu crescimento e qualquer outra cláusula que dite quem você é, o que quer ser ou vir a se tornar; cabe apenas a você! Essa é a supremacia do livre arbítrio. Essa é a preeminência da liberdade! É TUDO O QUE VOCÊ SEMPRE BUSCOU!"
Um cigarro, uma unha e o olhar de quem não tinha mais nenhum poder sobre mim dentro de poucos instantes. A minha voz havia voltado depois de divagar até a minha grosseria natural:
   - Quer saber, cara? Qual seu signo? E não me venha com a baboseira de "você é uma dessas que acreditam em signos?" já que, na verdade, eu sou uma dessas que acredita que continuo não dando a mínima sobre o seu signo até porque você não me pareceu interessante o suficiente desde que começou a encarar a minha unha roída e o meu cigarro como se existisse mesmo um universo paralelo onde você fosse superior a mim; foi só uma maneira educada de puxar assunto com o rei de um Estado que eu não tenho o menor interesse em conhecer. Se preferir, pergunto qual a sua data de nascimento e finjo que te farei uma surpresa no seu aniversário... Quer saber? Foda-se. Não converse mais comigo.
Um retrato de como fiquei conhecida por ser arrogante, mas que na realidade, se tratava de um resgaste a minha personalidade. Nunca foi sobre ninguém além de mim, não faria sentido. Não pra mim!